terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Análise do conto "A ama-seca" de Arthur Azevedo.

A análise do conto “A ama-seca” mostra o quão intensa foi a obra deste teatrólogo e contista brasileiro. Arthur Azevedo consegue abordar de forma simples, direta e inovadora uma temática utilizada a exaustão no Realismo, seja internacional, com O primo Basílio, de Eça de Queiroz e Madame Bovary, de Gustave Flaubert, seja nacional, em que Machado de Assim deixa nas entrelinhas a suposta traição de Capitu.
O diferencial presente em Arthur Azevedo é o fato de ir contra o padrão imposto pelo Realismo. No conto “A ama-seca”, o personagem principal é Romualdo, personificação do homem que, por infelicidade do Destino e pelo tédio, acaba traindo a mulher, da mesma forma que a Luísa de Eça e Emma de Flaubert traem o marido. O diferencial é que, enquanto Romualdo é homem, Luísa e Emma são mulheres.

O Romualdo, marido de D. Eufêmia, era um rapaz sério, lá isso era, e tão incapaz de cometer a mais leve infidelidade conjugal como de roubar o sino de São Francisco de Paula; mas — vejam como o diabo as arma! Um dia D. Eufêmia foi chamada, a toda a pressa, a Juiz de Fora, para ver o pai que estava gravemente enfermo, e como o Romualdo não podia naquela ocasião deixar a casa comercial de que era guarda-livros (estavam a dar balanço), resignou-se a ver partir a senhora acompanhada pelos três meninos, o Zeca, o Cazuza, o Bibi, e a ama-seca deste último, que era ainda de colo.*

Já a mulher de Romualdo, dona Eufêmia, que deveria ser o personagem infiel do texto, é a personificação da mulher ideal, a correta, santa, boa e cordial.

(...)D. Eufêmia lhe escreveu, dizendo que o velho estava livre de perigo, mas a convalescença seria longa, e o seu dever de filha era ficar junto dele um mês pelo menos. (...).Dez dias depois, estava ele arrependidíssimo da sua conquista fácil, e com remorsos de haver enganado D. Eufêmia, aquela santa! Procurava agora meios e modos de se ver livre da mulata, cuja prosódia era capaz de lançar água na fervura da mais violenta paixão.*

Romualdo e sua familia podem ser comparadas com qualquer familia do século XIX, constituida pelo pai, chefe de familia, a mãe, pessoa que cuida do lar e pelos filhos. Nota-se, entretanto, que esta ainda é a constituição de muitas famílias brasileiras. Arthur Azevedo continua atual, apesar de ter escrito este conto a mais de um século.
Outro personagem coadjuvante é Antonieta, a algoz de dona Eufemia. Geralmente, nos textos do século XIX, a mulata tem um quê de pecado, de calor, de sensualidade. Antonieta não foge a regra.

Uma noite coube a vez ao Andaraí Grande. O Romualdo tomou o bonde do Leopoldo, e teve a fortuna ou a desgraça de se sentar ao lado da mulatinha mais dengosa e bonita que ainda tentou um marido, cuja mulher estivesse em Juiz de Fora.*

O Brasil, por ser um país tropical, é visto lá fora como um país tropical, recheado de mulatas sambantes, dengosas, maliciosas.
O espaço em que se passa a obra é outro fator que contribui para a traição cometida por Romualdo. O Rio de Janeiro, com toda sua beleza e magia, até hoje é lembrada como a capital da sensualidade, onde as mulatas requebram ao som do samba carioca. Até os dias de hoje a capital carioca tem um certo ar erótico.
A passagem de fatos de forma linear mostra que a narrativa está no tempo cronologico. Começa pela apresentação de Romualdo, de como ele era fiel, seguindo pela viagem da esposa a Juiz de Fora e permanencia da mesma na cidade. Segue, então, a traição, a volta da esposa e, por fim, o medo de que seu segredo fosse revelado.
A atualidade do conto não é vista apenas pela temática abordada, presente em muitas obras nos dias de hoje, nem só pelos personagens, que podem perfeitamente representar um pouco do ser-humano atual. É atual porque mostra situações que se encontram perfeitamente presentes nos dias de hoje.
Por fim, no desfecho da obra, o autor se utiliza de dois elementos para fechar o conto: o suspense pela revelaçao da nova babá, que coincide com o climax da obra, e a dualidade apresentada na ultima frase.O climax ocorre na revelação de quem é a nova babá, que colocaria à tona a traição de Romualdo. Arthur Azevedo trabalha de forma tão excepcional esta parte que o leitor tende a acreditar que a nova babá é a amante do marido infiel.

No dia seguinte, o Romualdo saiu muito cedo; ao voltar para casa, a primeira coisa que perguntou à senhora foi:
— Então? Já temos ama-seca?. .
— Já; é uma mulatinha bem jeitosa, mas tem cara de sapeca. Chama-se Antonieta.
— Hem? Antonieta?
— Que tens, homem?
— Nada; não tenho nada... E jeitosa?... Tem cara de sapeca?... Manda-a embora! Não serve! Nem quero vê-la!...
— Ora essa! Por quê? Olha, ela aí vem.*

O leitor tende a pensar várias formas de desfecho do texto. Será que Romualdo irá se livrar da ama-seca? Será que Antonieta irá cobrar-lhe o anel? A traição será descoberta? Dona Eufêmia perdoará esta infidelidade?
Eis que Arthur Azevedo surpreende a todos, ao revelar que a nova babá não é a mesma Antonieta com quem Romualdo traiu D. Eufêmia e que sua traição não seria descoberta.
Já a dualidade é presente na frase “Decididamente, há um Deus para os maridos que enganam as suas mulheres”* Isto porque na sociedade, é pregado que Deus ama e protege àqueles que respeitam suas esposas, são fieis e sinceros, tudo que Romualdo, pelo menos durante a ausência da mulher, não fora. Azevedo mostra o profano x religioso e castigo x benção e o faz de forma espetacular.
Tal conto de Arthur Azevedo revela aspectos não só da sociedade do século XIX, mas também do estilo unico deste grandioso autor e a sua presença nos dias de hoje.


*Retirado do livro de Contos de Arthur Azevedo.

4 Comments:

Blog Teste said...

Olla tia tefy gostei muito do seu blog é do Análise do conto "A ama-seca" de Arthur Azevedo...eu até postei ele no meu blog , me deculpe qualquer coisa vc fala q tira tá...

Air said...

boto fé! ainda vou fazer letras! :D
:***

Unknown said...

Olá!
Vc não me conhece, mas achei o seu blog por acaso e li a análise do do conto a A Ama-seca do Artur Azevedo e adorei. Pois, estreamos um espetáculo recentemente, "Nabantino e Maria - um entenário Duelo de Palavras", em que encenamos, entre outras obras de Machado de Assis e Artur, este conto. Que legal! Fiquei muito feliz de alguém comentar sobre ele, pois adooooro Artur Azevedo. Não sei se vc é do Rio, mas se puder, venha nos assistir.
Um cordial abraço,
saudações literárias,
Antonio Sciamarelli ator e diretor da Cia de Lobos

Unknown said...

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